O BEM-AMADO: Dias
Gomes (1962)
RESUMO organizado pela
Profª Luci Rocha
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Produzida
no ano de 1962, a peça O Bem-Amado, foi ao palco somente em 1969.
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O
contexto histórico surge associado ao início da Ditadura Militar no Brasil
(1964-1985).
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As
cenas se passam numa pequena cidade litorânea da Bahia, Sucupira, de onde
pretende ser prefeito o verborrágico Odorico Paraguaçu.
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A
linguagem é coloquial e representativa dos tipos sociais da época.
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A
peça divide-se em 9 atos.
PERSONAGENS
1- CHICO MOLEZA: Tocador
de violão.
2- DERMEVAL: Dono da
venda.
3- MESTRE AMBRÓSIO:
Pescador. Entra na cena carregando a rede dentro da qual há o corpo de Mestre
Leonel.
4- ZELÃO: Pescador. Ajuda
Mestre Ambrósio a carregar o corpo.
5- MESTRE LEONEL:
Pescador falecido.
6- VELHA: Acompanha o
enterro, sempre rezando.
7- ODORICO PARAGUAÇU:
Inicia como vereador, candidato a prefeito.
Duas características
desse personagem chamam a atenção dos espectadores: a primeira é sua fala
rebuscada, verborrágica, cheia de neologismos, de político parlapatão, que por
meio de sua lábia, passa o tempo todo do enredo a armar estratégias para se
eleger e se manter no poder. A segunda, as próprias estratégias políticas de
Odorico, que, para se firmar no cargo, utiliza-se de quaisquer meios, mesmo que
ilícitos, pois, como ele mesmo define o jogo político, “os finalmentes
justificam os não obstantes.”
8- DOROTÉA: Solteirona,
“professora do grupo escolar, de maneiras pouco femininas, com qualidades
evidentes de liderança”. Fascinada por Odorico.
9- JUDICÉA: Solteirona,
irmã de Dorotéa, também apaixonada pelo vereador e futuro prefeito.
Envolver-se-á com um primo chamado Enesto.
10- DULCINÉA: Irmã de Doretéa e Juju. Casada com
Dirceu Borboleta, mas amante de Odorico.
11- DIRCEU BORBOLETA:
Marido de Dulcinéa. Colecionador de borboletas. Homem casto (“irmão oblato”:
que prometeu morrer virgem, por isso não tem intimidades com a esposa).
12- NECO PEDREIRA: Dono do
jornaleco da cidade: “A Trombeta”. Opositor de Odorico. É o dono do jornaleco
da cidade, A Trombeta. Jovem combativo,
algo esclarecido, afora uma certa dose de charlatanismo, é um indivíduo
positivo, um pouco acima da mentalidade da cidade. E a consciência disso lhe
produz certa frustração.
13- VIGÁRIO: padre que não
toma partido diante dos conflitos políticos.
14- ZECA DIABO: Cangaceiro
que volta à Sucupira, a pedido de Odorico. Este tinha esperança de que Zeca
Diabo pudesse cometer algum crime e fazer um defunto para a inauguração do
cemitério.
15- ERNESTO: Moribundo que
se recupera em Sucupira e se apaixona por Juju, sua prima.
16- HILÁRIO CAJAZEIRA: Tio
das Cajazeiras. Traz a notícia que de o corpo de Dulcinéa deverá ser enterrado
em Jaguatirica, impedindo que Odorico inaugure o cemitério.
Primeiro Quadro
Pequena
praça de uma cidadezinha de veraneio do litoral baiano. Há uma grande árvore,
um coreto e uma venda. Sob a árvore, sentado no chão,
Chico
Moleza dedilha molemente o violão. Em frente à vendola, Seu Dermeval remenda
uma rede de pescar. É um mulato gordo e bonachão, de idade já avançada.
Passa-se
meio minuto. Entram Mestre Ambrósio e Zelão carregando um defunto numa rede. O
enterro é acompanhado apenas por uma beata, velhinha, enrugada como um
jenipapo, e um cachorro, um magro vira-lata, que vem amarrado à rede. Mestre
Ambrósio é um velho pescador de tez moreno-avermelhada, curtido do sol. Musculatura
batida, chapelão de palha, calças de algodão branco, sua figura infunde
respeito. Zelão é um negro reluzente, mais moço do que mestre Ambrósio,
pescador como ele. Traz vários amuletos no pescoço e um bom humor constante. A
velha reza baixinho enquanto os dois pescadores avançam até ao centro da cena,
com o passo não muito firme, e aí depositam o féretro. Moleza para de tocar e
descobre-se, em sinal de respeito.
O
apelido o define bem: gestos lentos, descansados, fala mole, é ele um retrato
vivo da cidade, onde a vida passa sem pressa.
Neste primeiro quadro, Mestre Ambrósio e Zelão
param para descansar e tomar uma cachaça na venda do Dermeval. Este pergunta se
acharam o corpo do pescador morto, Mestre Leonel, no mar, e os dois pescadores
respondem que foi na areia porque Janaína não quis saber do velho. Explicam
também que Mestre Leonel estava com quase cem anos, bebia muito e quase pedia
esmolas. Lembram que de todos os filhos que o velho tivera, só aparecia por
ali, de vez em quando, uma moça bem bonita, que “caíra na vida”. Zelão
acrescenta que ela é “um pedaço de mau caminho” e que se um dia pescar um cação
de três metros, há de gastar o dinheiro com ela.
Entra em cena o tocador de violão, Chico
Moleza, que se junta para perguntar como foi que encontraram o velho morto.
Mestre Ambrósio relata que o encontraram na praia, ao lado de um cachorro que lhe
lambia a cara e chorava. Moleza sugere jogar o morto no mar, porém Mestre
Ambrósio lembra que o mar sempre devolverá o corpo.
Chega Odorico Paraguaçu, vereador que pretende
se candidatar a prefeito. Está suado e vestido de terno branco. Ele inicia um
discurso, chamando atenção para a humilhação de o cidadão não poder ser
enterrado em sua própria cidade. Juntam-se a ele as irmãs Cajazeira: Dorotéa,
Judicéa e Dulcinéa, reafirmando o discurso num coro: “Queremos o nosso
cemitério, queremos o cemitério!”. Aplaudido, Odorico promete construir o
cemitério, se eleito nas próximas eleições. Assim, seu slogan de campanha passa
a ser: VOTE NUM HOMEM SÉRIO E GANHE SEU CEMITÉRIO.
Neste mesmo quadro, surge o jornalista Neco
Pedreira. Acende uma bombinha no meio do povo, revoltando as Cajazeira, e grita
que espera ser Odorico o primeiro a inaugurar o campo santo. O enterro segue. Uma
velha desconhecida continua rezando. Demerval observa que um cemitério em
frente à venda ajudaria porque gente de velório bebe muito.
Neco também encosta no balcão e pede um
“engasga-gato” (cachaça) e em conversa com Demerval, diz que o jornal vai mal porque na
cidade nada acontece de interessante: nem crime, nem roubo, nem mulher
corneando marido.
Segundo Quadro
Uma sala
da prefeitura. O ambiente é modesto. Durante a mutação, ouve-se um dobrado e
vivas a Odorico, “viva o prefeito!, etc. Estão em cena Dorotéa, Juju, Dirceu,
Dulcinéa, Vigário e Odorico. Este último, à janela, discursa.
Odorico aparece à janela para agradecer ao
povo que o elegeu prefeito. Sob aplausos, confirma a construção do prometido
cemitério, para que todos “possam morrer em paz”. É elogiado por Dirceu e pelas irmãs Cajazeira que o convidam
para um licor de jenipapo à noite.
Odorico fica sozinho com o secretário Dirceu e
o padre. Este pergunta ao prefeito se ele tem a intenção de já iniciar os
trabalhos. Odorico avisa que não perderá tempo e aproveita para pedir uma
colaboração ao vigário. No entanto, o religioso se esquiva, justificando que
precisa reformar o teto da igreja e por isso até deverá fazer umas
quermesses.
Ao examinar os processos trazidos por Dirceu, ambos se certificam de que as verbas são escassas. Mesmo assim, Odorico sugere
desviar a verba da água e da energia, alegando que ninguém precisa ler durante
a noite.
Quanto ao lugar para a construção, resolvem expulsar o circo da
cidade que ocupava um terreno da prefeitura: Chega de palhaçada de antigamente. Prafrentemente, vamos tratar de
coisas sérias!
Depois de tudo resolvido, avisa ao padre que
pretende inaugurar o cemitério em três meses, com banda de música e marcha
fúnebre.
Entra Dulcinéa e sai o padre. A mulher de
Dirceu Borboleta está preocupada porque achou que estivesse grávida. Conta isso
rapidamente a Odorico, mas se cala diante do marido que aparece. O marido avisa
que não poderá ir para casa cedo porque agora é secretário do prefeito. Ela sai
e Odorico aproveita para falar a Dirceu que ele e a esposa precisam de ter
filhos. No entanto, Dirceu revela que é “irmão oblato” , fez voto
de castidade, o que deixa Odorico muito surpreso.
Terceiro Quadro
Aparece Odorico muito irritado lendo e
amarrotando o jornal A Trombeta, de
Neco Pedreira. Reclama com a professora primária, Dorotéa, que acaba de chegar à Prefeitura.
No jornal, uma foto de Odorico ilustra os dizeres: “Odorico, o pastor de
urubus”.
O prefeito pede conselho à professora e ela
sugere não mexer com o moço d’ A Trombeta,
pois estaria inflamando o resto da oposição. O melhor seria inaugurar logo o
cemitério, para dar utilidade à obra, já que a Câmara Municipal estaria
preparando um pedido de impeachment
de Odorico, com o argumento de quele estaria esbanjando dinheiro público.
Pensam em comprar um defunto, vindo de
Salvador, mas desistem da ideia diante da possibilidade de descoberta da
oposição. Odorico considera um grande azar não morrer nenhum turista,
justamente no ano em que mais precisa de um cadáver.
Chico Moleza, agora coveiro, chega anunciando
que não há qualquer notícia de ninguém doente ou para morrer. Odorico acusa-o
de “parasita do município”, pois ganha sem trabalhar.
Entra Juju, irmã de Dorotéa e Dulcinéa. Ela
avisa que recebeu um telegrama da tia Clotilde. Nele, a tia avisa que o primo
Ernesto, desenganado pelos médicos, estaria chegando em Sucupira para tratar de
uma “pneumonia galopante”. O moço morreria a qualquer momento.
Diante da notícia, Odorico se anima: manda
preparar o carro para buscá-lo na ponte, avisa o vigário, coloca a banda para
ensaiar a marcha fúnebre e pede a Moleza para voltar para o cemitério e ir
preparando a cova. O inquilino vem aí.
Quarto Quadro
Em casa das
solteironas. Enquanto, no quarto, o primo Ernesto agoniza, na sala Odorico
decora a oração fúnebre.
Juju olha com pesar o primo moribundo e
lamenta que um moço tão jovem e inteirinho possa ser desperdiçado com os
vermes. Dorotéa olha com repreensão para a irmã.
Depois de três dias, Ernesto continua
agonizando, mas não falece. Odorico fica irritado e chega a comentar: Nunca vi tanta vocação para agonizante. É um
agonizantista praticante!
Em um momento a sós, Odorico sugere à Dorotéa
que se divirtam um pouco, pois todos estão distraídos com o moribundo. Ela se
recusa, alegando que o primo está morrendo e isso seria um pecado.
Dirceu entra e diz em voz alta: Apagou! Odorico logo pensa que seria a
boa notícia da morte de Ernesto, mas, infelizmente para o prefeito, era apenas
mais uma vela que se consumia.
Quinto Quadro
Dorotéa e Dulcinéa aguardam Odorico na sala da
Prefeitura para contar a ele sobre a saúde do primo Ernesto. Estão ansiosas para
denunciar Juju, que cuidou do primo e agora o está namorando.
Dirceu chega desconfiado da esposa, falando
que mulher não deve se meter em política porque o povo fala mal. Dorotéa
repreende o cunhado, argumentando que aquilo era preconceito dele e que mulher era igual ao homem.
Odorico chega e fica sabendo sobre a excelente
recuperação da saúde de Ernesto. Fica
furioso. As irmãs explicam em coro que foi “o ar da cidade, a água da cidade, o
clima da cidade”, sugerindo os carinhos íntimos de Juju para com o primo.
Ernesto e Juju chegam para agradecer ao
prefeito. Este se sente traído pela amiga Juju que parece bem feliz com o
namoro.
Desesperado, manda buscar um assassino
afamado: Zeca Diabo, o terror do Nordeste.
O cangaceiro vem trazido por Mestre Ambrósio. Chega desconfiado, com voz macia,
contrastando a lenda de homem feroz.
As mulheres se retiram e Zeca Diabo explica a
Odorico por que fugira da cidade de Sucupira: um tal Coronel Lidário havia
mandado surrar, até a morte, um irmão de Zeca Diabo. O menino de 14 anos
roubara um cavalo do Coronel, por isso este se vingara.
O cangaceiro explica que revidou matando
Lidário, a esposa, três filhos e a sogra. Odorico comenta exultante: Seis cadáveres. Seis enterros. Tempos de
fartura!
Depois disso, Zeca diz que é um homem bom, que
não mexe com ninguém e que sua fama é “maledicência” das pessoas. Odorico
provoca-o dizendo que Homem que leva
desaforo pra casa não é homem. Para deixá-lo ainda mais à vontade para
praticar algum crime, Odorico manda despedir o atual delegado e oferece o cargo
a Zeca Diabo.
Avisa ao novo delegado que sua primeira
atividade será dar uma "batida" na redação do jornal do Neco Pedreira, que é uma gazeta subversiva.
Zeca sai e entram as mulheres. Dulcinéa e
Dorotéa ficam apavoradas com a ideia de Zeca Diabo ocupar o cargo de delegado.
Certamente seria um prato cheio para a oposição e um perigo para a cidade toda.
Odorico não se abala e arremata: Em política, Dona Dorotéa, os finalmentes
justificam os não obstantes...
Sexto Quadro
Depois de alguns dias, uma confusão acontece
na redação do jornal. Neco Pedreira havia colocado na primeira página: ‘Odorico nomeia cangaceiro. (Pega um jornal
e lê) ‘Assassino sanguinário, vergonha da espécie humana é o novo delegado de
Sucupira.’
Dulcinéa aparece dialogando com o prefeito.
Ela está preocupada porque já fazia três horas que Zeca Diabo estava na gazeta.
Depois de se ouvirem dois tiros, Odorico se anima com a ideia de Zeca assassinar
Neco. Planeja fazer um discurso na beira da cova do jornalista e depois
despachar o cangaceiro da cidade. Dulcinéa observa que talvez não dê tempo de
Zeca fugir, que o povo poderá se revoltar. Odorico emenda dizendo que é melhor,
porque, se assim acontecesse, haveria
dois defuntos para a inauguração do cemitério.
Neco, que ouviu o final da conversa, entra na
sala da prefeitura, dizendo que ainda não seria daquela vez. Traz com ele uma exemplar do jornal que sairá no dia seguinte, com os dizeres: ‘A vida de Zeca Diabo contado por ele mesmo.
De cangaceiro a delegado. Exclusividade de A Trombeta’.
Odorico fica sabendo que Zeca Diabo vendera
seus direitos biográficos a Neco. O jornalista vai fazer sucesso com a história
do cangaceiro. Os tiros eram da arma de Zeca, que fazia pose para as
fotografias.
Estando a sós, Odorico pede explicações a Zeca
Diabo. O cangaceiro diz que Neco está dentro da lei e ele, como delegado que
era, estava cumprindo a lei que garante a
ele (Neco) dizer o que quer dizer.
Odorico exalta-se. Inconformado, chama Zeca Diabo de pamonha, Madalena arrependida,
vergonha da classe. Zeca pega-o pela gola do paletó e saca o revólver.
Conta até dez e desiste de atirar, agradecendo “Padim Pade Cícero”, e sai.
Dulcinéa aproxima-se apavorada, perguntando se
Odorico estava bem. Revela que está grávida. Ele acha péssima a notícia numa
hora daquelas.
Combina com Dulcinéa para que ela vá até a
gazeta chamar o jornalista. Pretendia entrar num acordo com ele para que a tal
história da vida do cangaceiro não saísse. A mulher alerta para o ciúme do
marido Dirceu, que anda muito desconfiado dela. Sai e vai ao jornal como
Odorico pedira.
Quando Dirceu chega à sala do prefeito, fica
sabendo que Dulcinéa fora falar com Neco. Odorico faz questão de contar
oferecendo pistas para que o marido pudesse desconfiar de Dulcinea. Dirceu
revela que vinha recebendo cartas anônimas. Odorico inflama mais ainda o homem,
dizendo que a cidade inteira sabe, que o caso é público, que é uma dupla
traição!
Dirceu conta também que achou um teste de
gravidez. Odorico aproveita para animá-lo a ir tirar satisfações com o
jornalista. Oferece uma arma a Dirceu, que sai desnorteado.
Dorotéa chega e ainda vê Dirceu sair
apavorado. Odorico conta a Dorotéa sobre a desconfiança do cunhado dela.
Ouvem-se
seis tiros.
Odorico comenta que pelo menos um tiro deve
ter acertado. Fica animado. Dirceu volta correndo, sem óculos, não viu em quem
acertou. Odorico pede que se esconda na igreja, recuperando a arma.
Zeca Diabo entra procurando Dirceu e avisa a todos que o marido matou a esposa Dulcinéa. Dorotéa fica em pânico. Odorico denuncia Dirceu, e
Zeca vai buscá-lo na igreja.
Dorotéa agradece por Odorico ter delatado
Dirceu ao delegado. Ele completa cinicamente:
E ela, afinal de contas, além de sua irmã, era nossa companheira de lutas.
(Arruma-se para sair. Tem um ar triunfante.). Vamos, quero ver o cadáver.
Sétimo Quadro
No dia
seguinte à tarde. Vê-se uma parte do caixão, que se acha exposto à visitação na
sala ao lado. Vigário, Juju, Ernesto, Moleza, Dermeval, a Velha Beata, entre
outros populares, fazem a sentinela.
Neco Pedreira entra para ver o corpo, todos
olham com desprezo. O jornalista pergunta ao padre por onde anda Odorico. Fica
sabendo que está tratando dos preparativos. Neco comenta que, enfim, o prefeito
vai poder inaugurar o cemitério, mas o vigário completa de forma repreensiva: Graças ao senhor. Neco defende-se,
dizendo que foi uma peça do jogo de Odorico e afirma que o prefeito esconde algo.
Ele (Neco) não conseguiu falar com Dirceu, pois este se encontrava incomunicável na cadeia. Ou seja, o moço não poderia provar nada sobre sua inocência.
O velório prossegue, para a alegria de
Odorico. Quando o enterro está quase saindo, chega um tio das irmãs Cajazeira,
o Coronel Hilário Cajazeira. O homem traz uma carta na qual o irmão (pai falecido
das três mulheres) pedia para que elas fossem todas enterradas ao lado dele, no
cemitério de Jaguatirica. Depois de imensa confusão, as irmãs se enfurecem
contra Odorico. Ele discursa na janela a favor de enterrar Dulcinéa em Sucupira
e é aplaudido.
Oitavo Quadro
No dia
seguinte. Amanhece. Odorico cochila numa cadeira. O defunto continua no mesmo
lugar, velado pela Velha Beata e por Moleza, que dorme a sono solto. Moleza
acorda, dirige-se à janela e, ao passar
por Odorico, este desperta sobressaltado.
Odorico quer saber com o vigário sobre a
decisão da família de Dulcinéa. Descobre que ela será mesmo conduzida para
Jaguatirica. Ele teima que não. O padre avisa que o juiz deu autorização para
que o corpo fosse levado. Odorico xinga o juiz de patifento e de safado.
O padre alerta que o defunto começa a cheirar
mal e Odorico sugere embalsamar o corpo ou jogar perfume sobre o caixão. Enfim,
entra Zeca Diabo trazendo a ordem do juiz. Todos acatam, menos Odorico que
esbraveja: O defunto é meu e ninguém me
tira!
Zeca Diabo garante que, na condição de
delegado, vai fazer cumprir a lei. Diante disso, Odorico o destitui do cargo e
o ameaça de prisão por ser um fora da lei, decepcionando o cangaceiro.
O vigário intercede, lembrando que o juiz
poderia requisitar força estatal para mandar cumprir a lei; mesmo assim, Odorico
quer enterrar Dulcinéa para inaugurar seu cemitério.
A cena seguinte apresenta Neco voltando ao
velório e revelando a Odorico que conseguiu entrevistar Dirceu Borboleta na
cadeia. O preso contou tudo ao jornalista. Odorico nega, chamando o jornal de “imprensa
marronzista”. Todos se voltam contra ele, menos Dorotéa que ainda colabora com
um plano do prefeito: ele pretende fingir que foi assassinado pela oposição para comover o povo. No final desse diálogo, entra Zeca Diabo.
Odorico explica o plano de sua morte ao ex-delegado e vai
revirando as cadeiras, preparando o cenário para o suposto crime, enquanto Zeca
observa com olhar duro. Já com o revólver na mão, o matador sugere que seria bom
que o prefeito também pegasse a sua arma. O outro entende que é para dar mais
realismo à cena, mas, na verdade, Zeca anuncia que pretende matá-lo.
Diante do inusitado, Odorico pensa que é uma
brincadeira e, em seguida, apavora-se. Zeca Diabo pede o Odorico que atire,
este se recusa. O outro conta até três. Ouvem-se tiros de dois revólveres.
Apagam-se as luzes. Marcha fúnebre de Chopin.
Nono Quadro
Na boca de cena, o
portão do cemitério, encimado pela inscrição: “Revertere ad locum tuum.” De costas
para o público, cercando o túmulo oculto pelas coroas, o Vigário, Dorotéa,
Judicéa, Ernesto, Hilário Cajazeira, Dermeval, Mestre Ambrósio, Zelão, a Velha
Beata e populares. De frente para a plateia, em plano mais elevado, Neco
Pedreira. A seu lado, Moleza com a sua pá de coveiro. Neco discursa.
NECO – Odorico
Paraguaçu, aqui estamos para o último adeus a ti que foste um exemplo para
todos nós. Exemplo de probidade e caráter, de perseverança e lealdade, de
justiça e amor aopróximo. (Uma garrafa de cachaça corre de mão em mão,disfarçadamente.
Dermeval, Zelão, Ambrósio, cada um toma um gole, sob o olhar de reprovação de
Dorotéa e Juju.)
DOROTÉA - Devia haver
mais respeito apesar de tudo.
JUJU – Afinal, ele era
uma autoridade.
NECO – Só tu, Odorico,
mais ninguém, podias merecer a subida honra de inaugurar este campo santo, que
foi a grande obra do seu governo, o grande sonho de sua vida, afinal realizado!
Adeus, Odorico, o Grande, o Pacificador, o Desbravador, o Honesto, o Bravo, o
Leal, o Magnífico, o Bem-Amado...
Bibliografia: O
bem-amado / Dias Gomes. – [14.ed] – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2017.
Esta
aula está registrada em cartório sob a Lei dos Direitos Autorais. Assim, “é
vedada a reprodução deste material — seja para fins didáticos ou comerciais —
sem a devida autorização da autora. LEI
Nº 9.610, de 19 de fevereiro, 1998.